24/09/2025
A Universidade de Fortaleza (Unifor), mantida pela Fundação Edson Queiroz, conta com um estudo pioneiro que utiliza a frutalina — proteína vegetal extraída da fruta-pão (Artocarpus altilis L.) — como aliada no combate à dor orofacial, condição que afeta milhões de pessoas em todo o mundo.
O estudo “Desenvolvimento de Nanosistemas à Base de Biopolímeros para Veiculação de Proteínas” é parte do ecossistema de pesquisa de excelência fomentado pela Fundação Edson Queiroz, que investe em soluções inovadoras capazes de transformar a saúde e a qualidade de vida da população.
À frente da pesquisa estão as docentes e pesquisadoras Profª. Drª. Adriana Rolim, coordenadora de Pesquisa na Vice-Reitoria de Pesquisa da Unifor, Profª. Drª. Ana Cristina de Oliveira, diretora do Núcleo de Biologia Experimental da Unifor, e o Prof. Dr. Angelo Roncalli, pesquisador do Nubex.
No cerne desse estudo inédito está a frutalina, proteína vegetal isolada da fruta-pão (Artocarpus altilis L.), cujo grande e multifacetado potencial farmacológico tem sido o verdadeiro protagonista.
Ao longo das décadas, estudos têm revelado a notável versatilidade da frutalina, que se destaca não apenas por sua potente atividade antinociceptiva (alívio da dor), mas também por demonstrar propriedades cicatrizantes, gastroprotetoras e antitumorais, entre outras. Tais características a posicionam como um fármaco de imenso interesse terapêutico.
A frutalina, uma notável proteína vegetal, foi purificada e caracterizada parcialmente há mais de 30 anos pela professora Ana Cristina de Oliveira, ainda em seus primeiros estudos científicos, como bolsista de iniciação científica. Essa base de conhecimento construída ao longo desse período foi essencial para as pesquisas subsequentes que, em 2014, demonstraram especificamente a atividade antinociceptiva da frutalina, abrindo caminho para o desenvolvimento das novas formulações atuais.
Apesar do comprovado potencial da frutalina, uma das maiores barreiras na farmacologia de proteínas e peptídeos persistia: a administração por via oral. Proteínas e peptídeos são macromoléculas extremamente sensíveis, inerentemente vulneráveis à degradação pelas enzimas digestivas e pelo ambiente de extrema acidez do trato gastrointestinal.
A professora Ana Cristina explica que essa “barreira gástrica” torna a via oral ineficaz para essa classe de moléculas, que são simplesmente digeridas antes de alcançarem a corrente sanguínea, exigindo rotas menos convenientes e mais invasivas, como as injeções. Por essa razão, a frutalina foi anteriormente testada apenas por via injetável (i.p. – intraperitoneal), o que, embora eficaz, limitava severamente sua aplicação clínica em larga escala e a acessibilidade para os pacientes, além de seu alto custo.
“A grande inovação do grupo de pesquisa do Núcleo de Biologia Experimental da Unifor reside no desenvolvimento de uma nanoformulação para a frutalina. Esta avançada tecnologia de nanoencapsulamento, capitaneada pelo professor Angelo Roncalli, atua como verdadeiro escudo protetor e um sistema inovador de liberação controlada, que protege a proteína da degradação enzimática e ácida no ambiente gastrointestinal”, explica a professora Ana Cristina.
As nanocápsulas, com tamanho inferior a 200 nanômetros e alta eficiência de encapsulamento, garantem que a frutalina chegue intacta ao intestino, onde é absorvida de forma eficaz. Graças a este sistema, a frutalina pode agora ser administrada por via oral – uma rota muito mais prática, segura, conveniente e com maior aceitação pelo paciente, representando um salto quântico no tratamento da dor.
“A partir desses resultados promissores, nosso grupo, com o apoio fundamental da Fundação Edson Queiroz, desenvolveu e otimizou uma nanoformulação que permitiu a administração oral da proteína”, ressalta a professora Adriana Rolim, coordenadora de Pesquisa da Unifor. “Os testes rigorosos com roedores demonstraram que o efeito da nanoformulação administrada por via oral foi não apenas equivalente, mas em alguns aspectos melhor do que o efeito da frutalina administrada pela via parenteral [injetável], comprovando a eficácia e a superioridade dessa nova abordagem revolucionária”, complementa.

Os resultados alcançados, que refletem a expertise consolidada dos pesquisadores do Nubex em biotecnologia, farmacologia e nanosistemas, foram tão impactantes que culminaram na publicação de um artigo científico em um dos mais prestigiados periódicos internacionais da área: AAPS PharmSciTech. O estudo detalhando a caracterização completa e a comprovada eficácia orofacial antinociceptiva da nanoformulação foi veiculado em 25 de agosto de 2022 pela renomada editora Springer, reforçando o rigor científico e a relevância mundial da descoberta da Unifor.
A publicação de pesquisa na forma de artigos representa a validação da comunidade científica, e os resultados divulgados são utilizados por outros grupos de pesquisa, o que permite o avanço do trabalho. “Pesquisas como essa posicionam a Universidade de Fortaleza como geradora de conhecimento na área de pesquisa em fármacos e medicamentos”, explica Adriana Rolim.
As pesquisas desenvolvidas na Unifor têm como um dos principais objetivos contribuir diretamente para o avanço e bem-estar da sociedade. Essa iniciativa não apenas propõe uma nova oportunidade terapêutica para o tratamento da dor orofacial, mas também abre a possibilidade para a administração oral eficaz de outros peptídeos e proteínas de grande interesse clínico, como a insulina.
O projeto é fruto da dissertação de Marina de Barros Mamede em seu Mestrado em Ciências Médicas pela Unifor, orientada pela professora Adriana Rolim. Os experimentos foram realizados no Núcleo de Biologia Experimental e contaram com a participação ativa dos docentes Ana Cristina de Oliveira e Angelo Roncalli, além da valiosa contribuição de outros egressos do curso e professores de instituições parceiras.
Em virtude de seu inegável potencial de contribuição social, o projeto científico foi aprovado pelo renomado Programa Emerge Labs Eurofarma no ano de 2019, destacando-se entre os 16 projetos selecionados em um processo seletivo de alta competitividade. Essa aprovação atesta a relevância do estudo e sua capacidade de transpor os muros da academia, conectando a pesquisa científica ao mercado de inovação e saúde.
Fonte: Diário do Nordeste